sábado, 23 de fevereiro de 2013

Crítica: Indomável Sonhadora

Fábula geracional é base para filme dedicado aos sobreviventes do Katrina

Em 2005 o furacão Katrina atingiu o litoral sul dos EUA, arrasando a vida de milhares de americanos. Hollywood já abordou infinitas vezes essa reconstrução da vida dessas pessoas, mas é agora, sete anos depois da tragédia, que chega o filme certo para consolar essas pessoas. Do estreante Benh Zaitlin, Indomável Sonhadora vem, com impacto, para mostrar a sobrevivência dos pantaneiros da ilha fictícia Banheira, um pântano totalmente submerso após a passagem do furacão.
Vivendo em harmonia com a natureza, esse povo, que facilmente entra na definição do bom-selvagem de Rousseau, recusa-se a sair de suas casas, mesmo estas submersas. Wink (Dwight Henry) é um desses cidadães, mas tem um problema: está morrendo e deixando sua filha pequena, Hushpuppy (Quvenzhané Wallis) para trás. Ele precisa ensiná-la, logo, a sobreviver em meio ao caos.
Narrado pela garota, a história seria muita fraca se não fosse a situação que essas pessoas estão passando. O espírito de sobrevivência desse povo se alia à insistência em permanecer em suas casas, mesmo não existindo mais, e a Hushpuppy, aqui uma verdadeira força da natureza. A maneira como ela ocupa a câmera quando foco da câmera não é apenas pelo cabelo, mas sim por representar toda a alma do lugar e das pessoas que ali moram. E Zaitlin não poderia ter feito melhor escolha do que Quvenzhané, em uma atuação de destaque em sua estréia nas telas, puxando todo o filme nas costas.
Outro ponto interessante é o elenco, composto totalmente por pessoas da região. De Wink à professora, passando pelos donos do bar, a sobrevivência do grupo ali ganha força pois todos ali sofreram com o desastre natural em New Orleans. Cenas como a festa na noite posterior à tempestade ganham tons ainda mais realistas pois o grupo realmente carrega características da região, famosa pela sua animosidade e festanças. Isso também explica a refusa de abandonar a moradia quando o governo vem em auxílio. As cenas do hospital podem deixar muitos espectadores confusos em relação à reação do grupo, mas cabe no propósito deste.
A fantasia é outro elemento que pesa. Exagerados, os auroques, criaturas míticas no filme, não estão ali para tirar a realidade das cenas, mas sim como alegoria para a história, colaborando nas pequenas metáforas de Hushpuppy. E ainda mais, criam um ar mais folclórico à trama, como se o diretor quisesse mostrar que ali, naquela região, o mundo fosse mais conectado à natureza, ao contrário de vários lugares do mundo, onde há cada vez menos natureza e mais ser humano.
Indomável Sonhadora é, ao seu final, uma fábula com toques de ecologia sobre o crescimento e a maturidade, além da superação, onde monstros são nossos próprios medos. A última cena, em que a câmera se afasta lentamente, atesta a força dessa população, que perdeu muito e sobreviveu.

Nota: 9/10

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