sábado, 30 de agosto de 2014

Crítica: Magia ao Luar

Na Riviera Francesa, Woody Allen fala do ser humano e sua procura pela felicidade

Por Pedro Strazza

O debate "fé e razão" permeia as entranhas da História desde o início, e é encontrada nas mais diferentes situações. É nos meios culturais, porém, que esta discussão se faz mais visível: das obras clássicas do renascentismo até o embate entre Jack e Locke em Lost, a relação a princípio antagônica entre a crença e a ciência encontra nas artes um espaço pelo qual possa, em variados cenários, ter argumentos desenvolvidos pelos dois lados, mesmo sabendo que a resposta definitiva para o assunto nunca possa ser de fato encontrada.
Magia ao Luar, o novo filme do cineasta Woody Allen, tem como tema central esta questão humana, mas sob um olhar mais intimista do ser humano e suas emoções. Na história, o experiente mágico de palcos Stanley (Colin Firth), famoso por seus shows sob o alter-ego de Wei Ling Soo, é chamado por uma família de alta classe do sul da França para desmascarar Sophie (Emma Stone), uma suposta vidente que estaria encantando o ricaço Brice (Hamish Linklater) e sua mãe Grace (Jacki Weaver) com sua clarividência.
O relacionamento de Stanley com Sophie, a partir deste ponto, dá o tom à narrativa do filme. Apesar de ambos usarem da magia como meio de sobrevivência, os dois protagonizam discussões e cenas interessantes acerca da necessidade ou não da crença em eventos sem explicação racional, procurando no processo responder a questão realmente fundamental: até que ponto o ceticismo do ser humano deve ir?
Para Stanley, a fé é uma ilusão tão boba quanto os truques que realiza em suas apresentações. Alter-ego de Allen aqui, o mágico acredita na razão e na ciência como únicas formas do homem conseguir alcançar a real felicidade, mas seguindo esta metodologia ele próprio tem uma vida no fundo estressante e sem alegrias. Quando começa a conhecer Sophie e acreditar na existência da magia, porém, sua existência ganha um sentido novo, e sua atitude torna-se mais prazerosa e com mais esperanças. Mas esta mudança de fato é verdadeira? Ou seria apoiada em fundamentos completamente imaginários?
Esta discussão, novamente, não tem como ser resolvida por Allen, mas este procura trazê-la a um ambiente em que ela possa ganhar contornos mais definidos. A Riviera Francesa, local onde se desenrolam os acontecimentos da trama, é conhecido, afinal, por seu luxo e sofisticação, e o cineasta, junto do diretor de fotografia Darius Khondji, capta essa aura mítica com planos iluminados e agradáveis. Sem contar a trilha sonora, que usa de jazz e pedaços de sinfonias suaves para conceber este microverso leviano e adocicado (no bom sentido).
O cuidado de Allen como diretor em Magia ao Luar, entretanto, não se verifica com mesma qualidade no roteiro. Ainda que contenha um tema central interessante e personagens bem elaborados - além de boas atuações de Firth e Stone como protagonistas -, a trama do filme não consegue escapar da previsibilidade de seus acontecimentos, e quando toma um rumo não previsto faz de uma maneira abrupta e artificial demais em relação ao que acontece.
Nada que prejudique demais o filme, pelo menos. Doce e encantador, este Magia ao Luar de Woody Allen usa de um eterno debate humano para falar do próprio desejo do homem pela felicidade que talvez nunca seja alcançada por ele. E para o cineasta, o embate entre fé e razão, pelo menos na Riviera Francesa, possuem algum equilíbrio desconhecido e misterioso - para o desespero dos céticos.

Nota: 8/10

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