terça-feira, 12 de agosto de 2014

Crítica: The Rover - A Caçada

David Michôd analisa a dor de viver sem o próximo em western pós-apocalíptico australiano

Por Pedro Strazza

A maneira como o ser humano aborda o sentimento de perda pode variar de pessoa para pessoa, mas individualmente nunca muda. A partir do momento em que toma consciência de si mesmo, o homem é obrigado a conviver repetidamente com o falecimento de indivíduos a quem nutre um carinho profundo (sua família e seus amigos, por exemplo), tornando-se necessário nessas ocasiões a passagem por um procedimento de superação sobre aquilo - o luto. E mesmo que cresça, amadureça e envelheça, a humanidade nunca conseguirá alterar tão profundamente o jeito com o qual encara a morte, a certeza maior na vida de todo ser vivo.
Como lidar, então, com esse sentimento tão penoso e desgraçado, se ele continuará a voltar para nos atormentar? Este questionamento, no fundo, é o que faz girar a trama de The Rover - A Caçada. Em um mundo onde o apocalipse foi gerado por um colapso financeiro de proporções globais, o filme do diretor e roteirista David Michôd mostra, em vários momentos de sua história, o quanto as relações humanas foram reduzidas pela sociedade a um nível praticamente nulo, restrito apenas a necessidades básicas de sobrevivência. O motivo? No cenário tão árido e desolador em que vivem, os habitantes desse universo talvez queiram evitar qualquer sofrimento maior.
Como todos os outros, Eric (Guy Pearce) também se fechou. Procurando apenas sobreviver, o protagonista de The Rover tem seu carro roubado quando decide tomar um pouco de água em um estabelecimento local, fazendo com que ele, por apresentar uma inexplicável conexão sentimental com o veículo, decida perseguir os ladrões. Para isso, entretanto, Eric precisará da ajuda de Rey (Robert Pattinson), o irmão com problemas mentais de um dos membros da gangue que sabe aonde eles estão, e isso o obrigará a realizar, na sua visão, o pior ato possível: interagir com o outro.
É a partir desta forçada união de forças, então, que o filme desenvolve sua linha narrativa. A cada novo desafio ou obstáculo enfrentado pelos dois, o público é apresentado a novas faces destes personagens, entendendo cada vez mais suas ações atitudes em relação ao próximo. E este processo afeta também a maneira como encaramos a atuação do elenco: Se no ínicio as performances de Pearce e Pattinson parecem exarcebadas e caricatas, o espectador aos poucos vai compreendendo o porquê das personalidades de Eric e Rey serem tão desfiguradas - principalmente com o primeiro, que revela ser um homem despedaçado pelo próprio passado que o atormenta, como é possível observar, posteriormente, na cena no canil.
Mas se com o desenvolvimento de personagens The Rover é eficaz, na construção de seu universo e de sua história há falhas visíveis. Ambientado no poeirento e monocromático deserto australiano, o filme não faz questão de estabelecer em nenhum momento as regras que regem seu pós-apocalipse, e isso vem a ser um problema quando a trama, por exemplo, elabora a instituição dos militares como sobrevivente do desastre econômico-apocalíptico sem qualquer explicação aparente para sua permanência. O roteiro, por outro lado, usa e abusa de situações clichê para guiar a sua história, tornando o rumo de alguns acontecimentos previsíveis demais.
Ainda que aborde seu tema central com eficácia e se utilize bem da competência de seu elenco, The Rover - A Caçada falha em pontos vitais e básicos da narrativa, consequentemente tornando sua trama um tanto cansativa. Uma pena, visto a profundidade do assunto discutido.

Nota: 6/10

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