terça-feira, 31 de março de 2015

Crítica: O Sal da Terra

Homenagem a Sebastião Salgado sofre com delírios de seus diretores.

Por Pedro Strazza.

Logo nos primeiros minutos, Wim Wenders conta para o público a maneira como conheceu o trabalho de Sebastião Salgado e os motivos para ter aceitado codirigir o documentário sobre a carreira do fotógrafo ao lado do filho deste, Juliano Ribeiro. Em sua narração, o cineasta alemão exibe grande fascínio pela obra do mineiro, ressaltando o seu talento único em capturar a humanidade com um único clique - uma das fotos de Sebastião inclusive se encontra em seu escritório para sempre lhe fazer chorar, segundo o próprio.
Esse sentimento de homenagem, misturado à massagem do ego dos envolvidos, permanece na narrativa de O Sal da Terra como o principal fio condutor de sua história. O filme, afinal, foi concebido por Juliano como maneira de entender e divulgar o trabalho do pai, que aproveita a oportunidade para engrandecer sua extensa carreira fotográfica, desde os primórdios tímidos em Minas Gerais à consagração profissional mundo afora. Um motivo justo, mas que acaba vitimado pelos esforços de seus diretores em tentar tornar claro demais seus reais motivos para filmá-lo.
Isso ocorre porque Wenders e Ribeiro possuem o mesmo objetivo, mas não a mesma intenção com Sebastião. Se o segundo busca no filme o porquê do homem ter sido menos "de família" e mais fotógrafo em sua vida, passando grandes espaços de tempo longe da mulher e dos filhos, o primeiro quer aqui desvendar o autor das fotos que o atingiram emocionalmente, quase numa relação confusa e mal estabelecida entre "mestres das artes". Quem se aproveita nesse choque é o próprio alvo dos documentaristas, que posicionado em frente aos seus trabalhos os analisa com superficialidade e conta um pouco de seus bastidores.
E de certa forma, o maior atrativo do longa acaba por ser justamente essa exibição dos livros e exposições do retratista. Mesmo que estas sejam passadas sem muita reflexão e tornem a produção em um candidato perfeito para uma mostra dedicada a Salgado, as fotografias tiradas por este encantam pela estética, dura e implacável com a miséria humana e encantadora com a natureza rejuvenescida.
Esse fascínio com a obra do mestre em questão, porém, fica por isso mesmo na narrativa elaborada. Sem o retrato rico e multifacetado de Cássia Eller ou o estado meditativo sobre a profissão e a arte visto há pouco tempo em Nick Cave - 20.000 Dias na Terra, O Sal da Terra é mais um atestado cinematográfico que um documentário em si, frustrado por estar no meio de uma briga de egos que buscam diferentes "algo a mais" do tema em questão.

Nota: 6/10

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