sábado, 28 de novembro de 2015

Crítica: A Visita

M. Night Shyamalan e found footage encontram a redenção em filme de gênero.

Por Pedro Strazza.

Embora seja um subgênero relativamente novo - sua descoberta aconteceu nos anos 90 com A Bruxa de Blair e está em moda desde o fim dos anos 2000 e o advento da franquia Atividade Paranormal - o terror de filmagens encontradas encontrou com velocidade uma estrutura geral que guiasse com satisfação a maioria de seus exemplares. O acréscimo lento de informações, a caracterização jovem das vítimas, o advento do suspense somente no terceiro ato, a câmera na mão e tantos outros elementos criados por Daniel Myrick e Eduardo Sánchez em 1999 parecem ter sido transformadas em diretrizes para o found footage dos dias de hoje, o que contribui para o inevitável esgotamento de tais obras na forma.

Com o manual tão bem estabelecido e decorado pelo público, chega a ser surpreendente então que um filme que se disponha a executar à risca tais regras como A Visita consiga trazer frescor a este. Escrito e dirigido por M. Night Shyamalan, cineasta de metodologia rígida, e produzido pela mesma Blumhouse Productions responsável pela retomada do subgênero, o longa se diferencia de tantos outros colegas por encarar o found footage menos como um registro de uma situação aterradora e mais como um jogo de percepções.

Percebe-se isso logo na chegada à estação de trem na Pensilvânia dos irmãos Becca (Olivia DeJonge) e Tyler (Ed Oxenbould), que vão pra lá no intuito de conhecer e visitar os avós (interpretados por Deanna Dunagan e Peter McRobbie) e dar algum espaço para sua mãe (Kathryn Hahn) se divertir. De posse de duas câmeras potentes e a ideia de filmar um documentário para reunir a família há tanto tempo quebrada, as crianças captam tudo com preocupação estética evidente, de forma tanto a atender as exigências do filme que querem fazer de início como, mais tarde, para evidenciar sua suspeita com a fazenda e seus parentes.

Essa progressão do mistério em questão e de quê de João e Maria, no entanto, não é lidada na evolução comum do filmagens encontradas, que em teoria prezaria pelas evidências visuais em prol do terror imediato. Cada ato suspeito é trabalhado por Shyamalan em tom de dúvida, seja no deboche escancarado dos irmãos com o horror e o documentário pelas piadas autorreferentes ou na própria falta de confiança que o espectador cria com os protagonistas na narrativa e sua paranoia crescente, lidada por sua mãe como algo infantil. Aliado ao conflito geracional estabelecido nas bordas, a sugestão, aqui, é a principal ferramenta da produção para tensionar o espectador sem que este o perceba.

Nesse momento é que se vê o quão bom fica a mistura do found footage com a narrativa de Shyamalan. Pois embora ambas sejam rígidas em essência, as duas estruturas encontram na pouca informação e no terceiro ato o ponto de catarse para suas histórias, e juntas trabalham para que tais características sejam executadas como se deve. Assim, enquanto a lógica do diretor é capaz de anular o eventual aborrecimento do subgênero com seus clichês e dá fluidez à trama em suas passagens mais lentas (a exemplo da cena de pega-pega nas fundações da casa), os convencionalismos do cineasta indiano - como a necessidade da reviravolta e do viés de relações humanas em suas obras - são melhor aproveitados aos propósitos do subgênero, que ganha estofo no conteúdo e potência em seus objetivos imediatos.

Tudo isso a serviço, claro, do terror, que em A Visita encontra delicioso ápice em todo o seu terceiro ato pelo peso da virada no roteiro e a proximidade naturalmente proporcionada pela visão em primeira pessoa do espectador. Apesar de desconstruir na risada o horror documental, o filme no fundo entende que sua maior força encontra-se no suspense e na reconstrução deste, atendendo tais medidas sem qualquer vergonha.

E se o viés João e Maria desempenha sua tarefa com considerável soberba, o horror acontece com naturalidade.

Nota: 10/10

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