domingo, 14 de fevereiro de 2016

Crítica: Deadpool

Mercenário tagarela entrega o que os fãs esperam e se intimida de ir além.

Por Pedro Strazza.

Produto dos atribulados anos 90, Deadpool é um personagem que, seguindo a lógica superficial de sua época, sempre viveu de uma subversão imediata, do impulso de levar a narrativa dos quadrinhos ao limite sem contudo dar real cabo disso. As constantes quebras da quarta parede, o excesso de violência em suas histórias e o humor mais "sujo" permitem que o mercenário saia das convenções estabelecidas e as critique com desdém, mas seus roteiristas e desenhistas nunca foram capazes de levar esse jogo a algo além da própria piada de ter um herói consciente de sua existência como protagonista de uma história em quadrinhos.

A lógica rasa do personagem, tendente ao desgaste e à arrogância, é repetida quase como um mantra em seu debute solo nos cinemas, que também se aproveita do caráter marginal de sua produção - foram mais de dez anos até ela se tornar realidade, e ainda com um orçamento relativamente baixo - para se estabelecer como comédia de escárnio do subgênero de super-heróis. O curioso é que, para um filme dedicado a fazer piada do grupo ao qual pertence, Deadpool parece confortável demais em realizar a história de sempre e tímido em problematizá-la pelo humor de fato.

Claro que o roteiro escrito pela dupla Rheet Reese e Paul Wernick está disposto a fazer piada com tudo e todos, incluindo aí tiradas com a confusa linha temporal dos X-Men nos cinemas, Hugh Jackman, a carreira do ator protagonista Ryan Reynolds e a sexualidade de Batman e Robin. E pelo menos a princípio, o longa dá sinais de que irá pra cima daquilo que considera óbvio e mundano, seja nos créditos iniciais repletos de clichês do subgênero (destas, me diverte em particular a irônica "Roteiristas: Os verdadeiros heróis aqui") ou na simultaneidade narrativa dos dois primeiros atos. É inegável no filme essa sede anarquizante de atirar para todo lado, similar à de seu herói em matar e rir de qualquer um em seu caminho.

Este sentimento de caos, porém, nunca abandona o valor imediato das cenas que reproduz, estando muitas vezes preso à violência e ao sexo explícitos delas. A bem da verdade, Deadpool só se permite à subversão de fato nestes momentos, porque no resto sua maior propensão é a de repetir a fórmula do justiceiro em chave egoísta: ainda há uma mocinha a ser salva, ainda há um vilão malvado a ser derrotado, ainda há a recusa em se admitir um herói; o que falta mesmo é um dia a ser salvo, único ponto diferente de qualquer outra produção do tipo.

Isso não seria tão grave se o longa se utilizasse disso como base para o seu humor demente e escrachado atacar sem restrições o cenário cultural que vive o cinema estadunidense, repleto de adaptações de quadrinhos como o próprio Deadpool. O filme, porém, acaba por optar pelas saídas mais fáceis, fazendo graça com temas e produções malhadas pelo público em busca da aceitação rápida deste, e hesita em disparar contra coisas que ou tenham um mínimo de amor entre seus fãs ou não tenham a relevância necessária para eles. O exemplo maior de ambos é Rob Liefeld, um dos criadores do personagem e eterno quadrinista odiado pelas massas, que não somente não é mirado pelo roteiro como também rende duas referências rápidas na narrativa.

O que funciona no longa então, se até a ação é filmada pelo diretor Tim Miller com desinteresse? A resposta talvez seja a comédia mais física, cujo apelo universal, bastante dependente da performance do ator e entregue por Reynolds - aqui redimido de seus erros passados - com timing cômico eficiente é capaz de proporcionar os momentos mais divertidos de Deadpool.  E se considerar o humor da produção, típico do garotão dos anos 90 com saudades dos 80 e contente em emitir piadas textuais sem qualquer inspiração sobre pinto e masturbação, o riso proporcionado por cenas como a do protagonista quebrando as mãos e os pés em combate ou de uma mão decepada com o dedo do meio levantado termina por ser a melhor opção mesmo.

Nota: 5/10

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