domingo, 5 de junho de 2016

Crítica: Warcraft - O Primeiro Encontro de Dois Mundos

Adaptação perde toda a força na abordagem distante das relações.

Por Pedro Strazza.

É um incômodo denominador comum entre grande parte das adaptações de videogames para o cinema a maior necessidade de se dar maior e desproporcional espaço na narrativa ao cenário no qual a história se desenrole, mesmo que a estrutura concebida por estes não seja desenvolvida para suportar tal fim. Extremamente vital na construção do game como obra, essa inserção do jogador ao meio e contexto vivido pelos personagens ao quais interage é muito diferente daquela pela qual o espectador é submetido quando este assiste a um filme, que defronte à tela não possui nenhum elemento de contato com a produção além do próprio olhar e, logo, depende do que a câmera lhe mostra para conhecer e entender a situação ao qual o longa busca apresentar ali. É uma diferença sensível e lógica, mas que ainda não foi bem compreendida por quem arrisca traçar a ponte de game para filme, gerando resultados bastante desastrosos no processo.

Bom exemplo deste problema é Warcraft - O Primeiro Encontro de Dois Mundos, a transposição do jogo on-line da Blizzard Entertainment para as telonas. Dirigido por Duncan Jones, o épico fantástico tem em mãos todos os elementos necessários para materializar essas suas propensões ambiciosas de gênero, mas ele parece preso a demandas que a princípio o impedem de estabelecer suas bases e, mais tarde, o derrubam em seus próprios conceitos.

Escrito por Jones e Charles Leavitt, o longa reconta as origens do conflito entre orcs (agrupados pela bandeira da Horda) e humanos (reunidos pelo nome de Aliança), formado a partir do momento que os primeiros invadem o mundo dos segundos através de um portal criado pelo vilanesco mago orc Gul'dan (Daniel Wu). Buscando manter a paz do território chefiado pelo rei Llane (Dominic Cooper) e salvar seu povo do inimigo, o cavaleiro Lothar (Travis Fimmel), ao lado do aprendiz de mago Khadgar (Ben Schnetzer), vai atrás de Medivh (Ben Foster), Guardião do reino e em teoria único capaz de oferecer proteção à população e às tropas. Nesse meio tempo, o orc Durotan (Toby Kebbell), que acaba de ter um filho com a esposa Draka (Anna Galvin), tem suspeitas de que o poder utilizado por Gul'dan para abrir o portal são os mesmos responsáveis pela destruição dos recursos de seu planeta natal, e junto do amigo Orgrim (Robert Kazinsky) e da orquisa mestiça Garona (Paula Patton) tenta criar alguma comunicação com os humanos para estabelecer a paz entre os dois povos.

Como se pode perceber pelo parágrafo acima, o longa possui as propensões de uma fantasia medieval grandiosa, que tem na macroestrutura a intenção de deslumbrar e encantar o público com sua História. E visualmente Jones materializa essa vontade de sua produção com bastante eficácia, criando ambientes e personagens de traços exagerados, seja pelos humanos com suas armaduras de ombreiras gigantes e espadas de guarda-mão ornamentadas mais do que o normal ou os orcs com seu design que mistura cartunesco (as mãos e corpos desproporcionais) e realismo (os rostos) com alguma eficácia. O diretor mostra-se aqui bastante à vontade para criar uma identidade visual distinta, que diferencie o filme de outras obras do gênero.

Jones, entretanto, mostra-se deslumbrado demais pela apresentação e configuração deste universo no cinema, e parece esquecer que o que proporciona a sensação de grandeza de tais épicos - e ao qual ele tanto busca repetir em Warcraft, sem sucesso - são as pequenas histórias que permeiam e formam a História daquele mundo. E chega a ser triste as consequências de tal equívoco: enquanto o diretor de forma débil recorre aos momentos de maior exibição de poder e de teste de força para alimentar os ápices de sua história, os arcos vividos pelos atores de tais atos são abandonados, introduzidos às pressas somente para dar alguma base ao espectador e não tomar muito tempo do resto da parte (em teoria) mais atrativa da trama, que acaba esvaziada de maior sentido emocional justamente por tais ausências. Tragédias se desenrolam e mortes acontecem, mas tudo soa distante e muito frio ao público, incapaz de sentir qualquer interesse com os personagens e seus destinos.

É claro que Jones não faz isso de forma inconsciente. O diretor quer que o espectador tenha maior atenção no quadro maior do roteiro, focada na grande guerra entre humanos e orcs e nos efeitos desta nas duas sociedades em igual medida, visando uma problematização do tema mais interessada nos coletivos ao invés dos indivíduos. Essa decisão, porém, se perde na distância concebida, que impede Warcraft de ter bons personagens dispostos a trabalhar tamanha temática com a eficiência necessária e termina por contribuir para tornar a história em um enrustido confronto maniqueísta. O Primeiro Encontro de Dois Mundos tem intenções boas, mas sua frieza com seus elementos o esvaziam de todo e qualquer encanto.

Nota: 4/10

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