quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Crítica: Rogue One - Uma História Star Wars

Derivado não encontra voz própria, mas tem no diretor uma salvaguarda.

Por Pedro Strazza.

Ainda que estejam localizados em espaços cronológicos opostos dentro da franquia, O Despertar da Força e Rogue One - Uma História Star Wars possuem propostas bastante semelhantes na relação com os outros filmes da série Star Wars. Primeiros frutos cinematográficos da saga sob o controle da Disney, os dois longas compartilham a mesma admiração pela trilogia original e o esforço de a qualquer custo se adequar dentro de seus moldes, algo refletido nos visuais sujos e empoeirados dentro das salas e naves onde suas histórias acontecem. São motivações vindas, claro, de seus diretores, fãs das aventuras concebidas por George Lucas e que nutrem uma vontade profunda de se integrar e demonstrar uma integração ao universo que cresceram venerando.

Nesse campo de adequação e admiração, entretanto, Rogue One possui um desafio muito maior em mãos em relação ao sétimo episódio, que apesar de buscar se enquadrar nos moldes dos capítulos anteriores tinha pelo menos a possibilidade de apresentar novas formas de encarar a fórmula já bastante conhecida do público. História que em caráter literal antecede os eventos do primeiro longa lançado da franquia, o filme de Gareth Edwards precisa ao mesmo tempo ser uma experiência controlada e diferente e proporcionar o mesmo nível da sensação de encantamento conhecido da franquia, que, fundamentada no gênero da space opera, tem na expansão e nas inúmeras possibilidades um de seus maiores charmes.

Este campo quase paradoxal no qual a obra está inserida é a maneira mais fácil de se entender o filme e sua razão conflitante de existência. Escrito por Chris Weitz e Tony Gilroy e acompanhando os esforços de um grupo de rebeldes liderados por Jyn Erso (Felicity Jones) e Cassian Andor (Diego Luna) em roubar os planos da Estrela da Morte do Império, a produção constantemente se põe como uma história distinta das outras contadas no cinema pela formação de um cenário de guerrilha e de uma trama mais "realista" em suas pretensões, mas também busca a integração à saga e o espetáculo em que ela se localiza. Se o mundo onde os protagonistas vivem é cinza e dominado pela opressão e o medo oferecidos pelos stormtroopers, a Força ainda prevalece como uma fonte de esperança.

O resultado é um longa indeciso sobre o que quer ser, e tal sentimento logo contamina o resto da estrutura. Isso, de certa forma, faz com que Rogue One se aproxime perigosamente do campo da fanfic, as típicas histórias escritas por fãs que ora ou outra buscam mostrar eventos apenas citados nos filmes: Edwards é bastante claro em seu desejo de se integrar ao universo, mas sua narrativa nunca chega a de fato compreender o funcionamento de Star Wars, se bastando na materialização dos acontecimentos e nas referências - aqui constantes e bastante diretas, incluindo aparições de figuras conhecidas como Bail Organa (Jimmy Smits) e até reconstruções em CGI de personagens como o Grand Moff Tarkin, do falecido Peter Cushing. 

No fundo, o que define o filme são estes momentos. Rendido à nostalgia em seu caráter mais direto, o longa se porta como genuíno produto de fã para fã, muito mais interessado em proporcionar estes pequenos momentos de alegria a quem curte a série há tempos que de fato se concentrar em algo novo. Quem deixa mais claro isso são os personagens, que vem e vão na história somente para mover a trama e não contribuem com mais além disso. E para os que fazem participações pontuais no roteiro, esta problemática só aprofunda o teor estilizado de seus papeis, como o ciborgue Saw Gerrera, interpretado por Forest Whitaker na base do overacting descabido, ou mesmo o Tarkin robótico, cujo visual é estranho do começo ao fim.

Ao grupo protagonista, por outro lado, o que falta é desenvolvimento. Enquanto a maioria do grupo ali parece estar envolvido por mero acaso, os dois atores centrais trabalham com arcos confusos e apressados: O Cassian de Luna vive um drama de responsabilidade sobre os atos feitos pelo movimento que nunca deixa o campo da insinuação; a Jyn de Jones parte como alguém indisposta com a Rebelião para algumas cenas depois se tornar a mais dedicada com a causa sem maiores justificativas. De um filme que se propaga como "mais sério", seus personagens curiosamente acabam por ser melhores nos momentos de comédia, encabeçados ora ou outra pelo robô K-2SO (dublado por Alan Tudyk) e o monge Chirrut Îmwe (Donnie Yen).

Mas estes problemas com personagem não soam como novidade ao cinema de Edwards, que apesar de ser responsável direto por algumas deficiências da estrutura também lhe proporciona seus melhores momentos. O diretor traz desde Godzilla (seu trabalho anterior) um senso de escala bastante particular dentro de Hollywood e do cinema estadunidense, que se repete aqui não apenas situando bem o espectador  sobre a desproporção entre as armas do Império e a força humana mas também criando uma materialidade daquele universo que gera impacto sobre qualquer público em cenas como a destruição de naves e seus destroços.

E no fim isso salva Rogue One do marasmo. Quando os protagonistas fogem desesperados de uma instalação imperial em plena destruição, o personagem de Riz Ahmed enxerga o poder da Estrela da Morte em execução ou alguns rebeldes desesperados são mortos por Darth Vader, Edwards promove uma mesma inversão de perspectiva que nunca deixa de intrigar, deixando o ar pomposo da série de lado e abordando uma visão de alguém que está dentro daquela história sem possuir qualquer centralidade neste. Uma pena que esta sensação de não pertencimento, de quem quer entrar no grupo legal do colégio mas não consegue reverbere para o restante do longa ao invés de efetivamente se fazer de uma questão de observação de elementos menores dentro de uma franquia que preza pelo grandioso.

Nota: 6/10

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