sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Crítica: Moana - Um Mar de Aventuras

Animação sabe aproveitar e se posicionar dentro da fórmula Disney.

Por Pedro Strazza.

Desde que as animações da Disney passaram a ser supervisionadas pelo chefe criativo da Pixar John Lasseter, as produções animadas do estúdio passam por um processo de recombinação de elementos dos mais intrigantes. Ainda que filmes como A Princesa e o Sapo, Operação Big Hero, Frozen e Zootopia repliquem a fórmula consagrada em clássicos da produtora, eles também reciclam essa metodologia pela incorporação de temas e cenários contemporâneos.

Até aí, a fase atual em nada se diferencia do chamado "renascimento Disney", que nos anos 90 também retrabalhou arcos clássicos das histórias infantis sob um novo e revigorado prisma. O que a torna única dentro do histórico do estúdio é a tendência de suas produções de uma forma ou de outra terem consciência das histórias tradicionais e, a partir disso, visarem uma efetiva desconstrução de valores do legado que as cercam.

Moana - Um Mar de Aventuras, mais nova animação da Disney, parte justamente deste ato de auto-consciência, algo já inserido desde o início com a introdução da mitológica figura heroica de Maui (Dwayne Johnson). Semideus da cultura polinésia, ele é responsável no passado pelo roubo de uma pequena pedra que serve de coração à deusa Te Fiti, um ato que a fez adormecer para sempre e permitiu que forças malignas dominassem os mares do Pacífico. Cerca de um milênio depois, a jovem Moana (Auli'i Cravalho), futura rainha de uma das tribos da região e em crise com as restrições geográficas impostas por seu pai (ela não pode ir além dos recifes), precisa encontrar o objeto depois de perceber que seus conterrâneos já não acham peixe ou frutos para se alimentar. Sabendo que Maui foi o último a ter posse do item, ela então desbrava o oceano pela primeira vez e vai atrás de seu paradeiro.

Não demora muito para que os dois se encontrem, e depois de Maui e Moana trocarem insultos e resolverem se unir para atingir suas próprias metas fica um pouco mais claro na narrativa que o objetivo dos diretores Ron Clements e John Musker - dupla conhecida pelas animações do estúdio que melhor mexem com o conceito do mito (A Pequena Sereia, Aladdin, Hércules) - é de contrapor as figuras heroicas de dois tempos. Pelo arco trágico clássico bastante amenizado do semideus polinésio (o abandono da mãe, quase uma constante nas mitologias antigas, é algo subentendido pela trama) e o da procura por um lugar no mundo da garota, típico dos heróis modernos, o longa mantém a dinâmica da dupla acesa durante a jornada por esses choques quase geracionais, pendendo sem muita surpresa para o lado da protagonista e a desconstrução do tipo durão que a acompanha.

Chega a ser natural, então, que a aventura fique um pouco de lado no filme, em ordem de abrir espaço ao estranho relacionamento amigável que se forma entre os dois. O roteiro de Jared Bush nunca deixa de manter a jornada em pauta, mas é evidente o teor capitular das situações, ligadas com elegância pelas canções de Opetaia Foa'i, Mark Mancina e Lin-Manuel Miranda. Até mesmo o divertido encontro com o gigantesco Tamatoa (Jemaine Clement), momento mais psicodélico da trama, soa um pouco fora do contexto da história, que preza por uma fantasia menos explosiva e pontual - como o espírito da avó de Moana (Rachel House), os gigantescos deuses do final e até mesmo os cocos dotados de vida que são os Kakamora.

Mas no fundo a grande força do filme está nas maneiras como ele lida com a fórmula do estúdio, o que não deixa de ser uma repetição do que foi visto em seus antecessores com melhor desenvoltura. Temas e situações batidas como a morte do ente querido, a valorização da tradição e a mensagem de desbravar o mundo são usados mais uma vez por Clements e Musker sem hesitação, sendo capazes de reintroduzir esses conceitos ao público de forma revigorada e com sensação de inédito. Moana tem uma percepção muito clara daquilo que busca aspirar dentro do histórico da Disney e sabe se portar como tal, dispondo da referência ao passado apenas para potencializar o próprio discurso.

Nota: 7/10

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